Mas se você pensar em nós como vindos da terra, não como tendo sido lançados aqui, de alguma parte, verá que nós somos a terra, somos a consciência da terra. Estes são os olhos da terra, e esta é a voz da terra.
Joseph Campbell
O poder do mito
Matéria e terra, a origem do humano. A exaltação e o caráter sagrado da terra. A série Mater's de pinturas não procura representar o meio natural, o mundo primitivo e selvagem, mas sim apresentar desde as suas remotas origens, desde a formação do mundo, a paisagem natural através da materialidade e da gestualidade; têm ao mesmo tempo registro abstrato e figurativo, um dos aspectos mais interessantes da pintura contemporânea, que se observa em artistas como Miquel Barceló e Thomas Reinhold.
Dedico-me à pintura desde que adquiri alguma destreza das mãos, por volta dos seis anos: pintava sobre papel A4 no chão e, como o material de pintura era escasso, usava a terra como pigmento e terra diluída em água para pintar; colava objetos nas composições, como tampas de frascos, garfos, parafusos, linhas coloridas, conchas, desenhava com lápis de cor e tinta de terra aplicada com pincel. Nessa época já experimentava variação de tonalidades conforme a diluição da tinta. Esse início também fundamenta precocemente meu fazer pictórico até a atualidade: o conceito de terra da minha poética, o processo de trabalho na horizontal, a variação de tonalidades.
Os Mater's sustentam que a possibilidade de transcendência se dá através da natureza, que o vínculo entre ela e o homem é indissolúvel.
“Porque é a interioridade ‘superlativa’ que constitui a noção de substância. ‘Para o espírito pré-científico, a substância tem um interior, melhor, é um interior’, e o alquimista, como o poeta só tem um desejo: o de penetrar amorosamente as intimidades. Esta é uma conseqüência do esquema psíquico da inversão: a intimidade é inversora. Todo invólucro, todo o continente, nota Bachelard, aparece com efeito como menos preciso, menos substancial que a matéria envolvida. A qualidade profunda, o termo substancial não é o que contêm mas o que é contido”.
No Regime Noturno da Imagem de Gilbert Durand acima, exploramos e penetramos a intimidade, a substância; assim é o interior, a intimidade da terra, ela atrai e contém o ser que se entrega ao engolimento, e se entregando penetra e é transformado por alquimia e/em poiesis.
Sela
2014
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